Henrique Vasconcelos
“Que melhor garante da pertinência do nosso método que o falhanço de todos os que não o seguem?”
Imagine-se um tempo em que havia semanas com 22h de aulas presenciais, algo acima das 17h da média Europeia, e tantas vezes mal usadas. Um tempo em que uma quantidade não negligenciável de palestrantes chega a uma secretária e perde mais de 10 min. a tentar ligar a sua pen-drive ao computador (aquelas máquinas modernas, ainda por democratizar…) e abrir um ficheiro que acaba por ser apresentado desformatado a toda a plateia.
Um tempo em que não é raro um professor considerar que, se os alunos cada vez menos vão às aulas teóricas, a solução é, sem dúvida, tornar essas aulas obrigatórias. “Era assim que devia ser” ouve-se em reuniões de regentes, onde o feedback de alunos é descartado como uma tontice resultado da inexperiência e o impedimento regulamentar à obrigatoriedade destas aulas é visto como mais uma barreira no caminho rumo ao progresso pedagógico. Neste tempo — em que porventura o medo de ferir um qualquer ego de uma qualquer eminência da oratória é grande ao ponto de não se perceber que a ausência de 240 dos 250 alunos inscritos na cadeira diz mais sobre a qualidade das palestras do que sobre os alunos -, em vez de se melhorar o conteúdo, inventa-se uma artimanha para aplicar a tão óbvia solução da obrigatoriedade: é certo que as aulas teóricas não podem ser de presença obrigatória, mas essa obrigatoriedade só se aplica se mantiverem o nome. Nada mais fácil que chamar-lhes seminários e, assim, poder decidir sobre as suas características sem nenhum desses irritantes que dão pelo nome de “regras” ou “legislação”. A novilíngua académica ao serviço da pedagogia. Felizmente, os tempos mudam. Chegamos a um novo tempo em que a estratégia é bem mais subtil. As aulas não são obrigatórias. O quórum é registado de forma qualitativa, refletida através de um “menos que no ano passado”, e a consequência vem, logicamente, na forma de um exame de dificuldade aumentada, quase como uma penitência que os mandriões devem cumprir pela falta de vontade em aprender. Que melhor garante da pertinência do nosso método que o falhanço de todos os que não o seguem?
Imagine-se um tempo em que, depois de tudo isto, se é avaliado com uma mão cheia de perguntas repetidas anos a fio, num sistema que beneficia desproporcionalmente mais quem sabe decorar perguntas e suas respostas (mesmo que cientificamente erradas) do que quem sabe pensar sobre a matéria avaliada. Em que a falta de recursos (outro problema, mas de âmbito diferente) faz com que seja tomada a opção mais fácil de reutilizar bancos de perguntas que já ninguém duvida que são passados de ano para ano, e em que o melhor método de estudo é olhar para o passado e decalcar. O melhor método de avaliação, esse, será algo diferente, sem dúvida.
Um tempo em que — maravilhas da modernidade — há alunos estrangeiros de Erasmus, a quem foi prometido um curso “suitable for English speakers”, e que mesmo assim, em grande parte, aprenderam o Português; alunos estes que são brindados, no fim de um semestre e à revelia do que foi acordado, com exames de extenso e intrincado enunciado em português porque — e é fulcral reforçar o sentido de abertura que este trecho revela — “se estão em Portugal falam português”.
Este tempo é, infelizmente, o presente. É tempo de evoluir.