Tiago Ferreira Meireles

“Em mesas já cheias de cinza

Vergamos a língua e o intelecto (…)”

EM MESAS JÁ CHEIAS DE CINZA

Em mesas já cheias de cinza

Vergamos a língua e o intelecto

Sentados, em cadeiras já sem tinta,

Foi assim que cresceu afeto

O tempo tem virtudes peculiares

Grande parte delas já não lembro

Cigarros… Contei-os aos milhares

Todos e eu: mero membro

Ninguém acredita na revolução

São pernas que vão atrofiando

Mais uma nuvem e digo com comoção:

“Os dias passam, mas a gente vai ficando”

 

À RODINHA NO JARDIM COLORIDO

À rodinha no jardim colorido

Na pubescência de um sorriso desdentado

Atiramos pedrinhas, sem consciência

Do futuro, presente ou passado.

Mas também as flores murcham

E a verdura do tempo longe vai.

Descem, castanhas, folhas onde outros alapam

E na minha sala, a chuva cai.

 

QUEM TE DEU OS OLHOS

Quem te deu os olhos

Deixou-me uma febre.

Quem te coseu a saia

Não me conhecia

Mas eu sempre vi o que vestias

E nunca escrevi sobre os folhos

Que usavas:

Não era em mim que reparavas.

E quem te deu os folhos

Sabia lá que seriam os meus olhos

A pagar as favas.