João Teles

“Amo tão-somente a dor indolente
Sempre tão presente
E sempre tão ausente
De nada querer ser.”

Não há quem me possa dar
Um pouco de mim?
Alguém para me desenhar
E dar, por fim, um fim?
Exproprio-me totalmente
De querer ser alguma coisa.
Amo tão-somente a dor indolente
Sempre tão presente
E sempre tão ausente
De nada querer ser.
E nada sou. Nada é.
Desnudo-me no teu abraço
Sôfrego deste leito morno, escasso,
Em que jazes pouco vivo.
Que melódico descompasso
Ser profundamente apaixonado
Ao ver-te, a ti, aí:
Ornado de sóis e maresia
De música e poesia.
E eu, só eu, aqui.
Eis o despontar
Da madrugada da sensação
Em que damos as mãos
E te juro a eternidade
(Para já temos idade
Para crer ser imortais).
Que devastação deve ser
Ser como outros são:
Decapitados de imaginação.
Eu presto-me à imoralidade,
À loucura, à insanidade.
Quero ser perdido, contigo,
Onde haja liberdade
(parece que p’ro mundo
Ser livre é um pecado).
Parto, de vez
Para est’outro lado da vida
Em que sou apenas o que sou.

Queres vir, também?

Eis que damos as mãos
E me juras
“Vou”
(Vamos)